Pela primeira vez, a população acima dos 60 anos superou a de crianças com menos de 5 anos. E essa proporção tende a ser cada vez maior. Em 2050, estima-se que o Brasil será o 6º país mais velho do mundo. Diante deste cenário, empresas que não levam em consideração a potência do público sênior estão fadadas a perder uma importante fatia do mercado.

“Esse processo não tem mais volta, ele só vai acelerar. E a sociedade vai mudar muito. A participação do pessoal mais velho vai crescer em quantidade. A opinião deles será muito mais forte e teremos uma quebra de paradigma, não apenas no consumo”, afirma Karlan Muniz, pesquisador, consultor e professor com foco em comportamento do consumidor.

Adeus aos estereótipos

Com a força do público 60+, reconhecer o perfil e os hábitos de consumo dessa população é incontornável. Mas para que isso seja feito de forma efetiva, é urgente que o mercado supere estereótipos que não condizem com a realidade deste público. A imagem de um idoso de hábitos caseiros, cuja vida é dedicada apenas aos cuidados da casa, da família e da saúde, está ultrapassada. “Essa pessoa ainda existe, mas está em extinção. Hoje, uma pessoa com mais de 60 anos tem um perfil de consumo muito mais diversificado”, afirma Muniz.

O mesmo é apontado por Roberto Herrera, Diretor de Negócios da Hype50+, empresa de marketing especializada no consumidor maduro. “Esta é uma visão míope e preconceituosa do senso comum”, diz Herrera. “Restringir o consumo deste público a produtos ou serviços de saúde, é dizer, em outras linhas, que estas pessoas se preocupam somente com a sua saúde. Na verdade, os 60+ estão superativos e consumindo muito além deste mercado.”

Quem é o público 60+?

A pergunta é bastante abrangente e não dá conta de compreender a especificidade de cada fase da vida. Uma pessoa com 60 anos, por exemplo, tem necessidades diferentes de outra com 80. Mas para traçar um panorama geral desse público, recorremos à questão geracional e socioeconômica para trazer pistas e insights sobre o perfil dos 60+. Confira:

Têm mais poder aquisitivo

A chamada “economia prateada” recebeu este nome por estar associada a uma população de cabelos brancos, mas também pela capacidade de compra deste público. Uma pesquisa realizada na FVG aponta que, em 2017, a renda média da população acima de 65 anos superou em 40% a renda média da população entre 14 e 64 anos. E a discrepância é ainda maior entre os idosos economicamente ativos. Entre eles, a renda média é mais do que o dobro daquela da população economicamente ativa entre 14 e 64 anos.

Outro estudo, divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) em 2020, aponta que 24,9% dos lares brasileiros têm pessoas com mais de 60 anos que contribuem com mais de 50% da renda domiciliar, com aposentadorias, pensões, rendimento do trabalho ou outro tipo.

Mirar no público sênior, portanto, é mirar em pessoas que têm um maior potencial de compra. Mas as vivências não resultaram apenas em uma maior concentração de renda. Este público também valoriza mais o dinheiro, o que os torna muito mais exigentes.

Valorizam mais o dinheiro

Muniz destaca que, no Brasil, a geração baby boomer vivenciou momentos históricos como a ditadura militar, a redemocratização e hiperinflações, o que marcou profundamente sua relação com o dinheiro. “Por ter vivido tudo isso, ela entende o valor do dinheiro até mais do que as outras gerações”, aponta o especialista. Ele encontra eco nas reflexões de Herrera, da Hype+50.

“Percebemos que os baby boomers trazem consigo valores muito profundos como: o respeito à vida, o cuidado com os seus e os próximos e a importância de viver o agora. E isto os caracterizam como consumidores racionais e, ao mesmo tempo, sensíveis aos prazeres da vida”.

Na prática, isso se traduz em um alto nível de exigência na hora da compra. É o que percebeu a construtora e empreendedora A.Yoshii, que acompanhou a tendência dos empreendimentos Senior Living, colocando as necessidades deste público em primeiro lugar. A gerente de Marketing do Grupo A.Yoshii, Maria Fernanda Beneli Vicente, destaca que o público sênior é o mais questionador. “São mais atentos a hall com pé-direito alto, mobiliário adequado, questionam tamanhos de porta e mais”, conta.

São leais

Se por um lado é mais difícil conquistar este público, por outro, eles são mais leais. Os especialistas destacam que este perfil geracional está bastante ancorado em relações interpessoais profundas e duradouras, especialmente comparando-se aos millennials. Por isso, o atendimento e o relacionamento com o cliente é um ponto essencial para toda empresa que deseja conquistar este público.

“No mundo líquido de hoje, os relacionamentos vêm e vão. Para essa geração não, se eles constroem um relacionamento, o vínculo não vai se quebrar facilmente. E isso pode ser levado para as marcas. São pessoas que têm uma possibilidade muito grande de serem leais a marcas e empresas que resolvam o dia a dia delas”, afirma Karlan Muniz, pesquisador, consultor e professor com foco em comportamento do consumidor.

Mas dizer que o público 60+ é leal, não significa dizer que ele não está aberto a novidades. Inclusive, a abertura para novas experiências é uma das marcas desta nova geração de pessoas com mais de 60 anos, que desejam, cada vez mais, viver tudo o que é possível.

Estão conectados

O público 60+ está conectado. Dentro e fora das redes. Foto: Pexels

Por fim, a ideia de que o público maduro está desconectado está desatualizada. Especialmente se levarmos em conta o contexto pandêmico, que acelerou a transformação digital em todos os setores e públicos. De acordo com a pesquisa “Tecnologia e aceleração Digital para os Masters” (2021), 64% do público +60 acessa a internet. A porcentagem dobrou em relação aos últimos cinco anos. A pesquisa também mostra que 75% deles compraram algum produto ou serviço online nos últimos 3 meses. Assim, as empresas que não investem nos canais digitais para conversar com os mais velhos, oferecendo ferramentas que possam simplificar essa relação, já estão atrasadas.

“O ponto é que agora [o uso da tecnologia] não é mais apenas para se relacionarem, mas para consumirem, uma vez que a pandemia impôs o isolamento social muito forte para este público. A experiência buscada na internet deve ser a mais próxima da experiência física. Isto é, a excelência no atendimento.” Roberto Herrera, Diretor de Negócios da Hype 50+.

Cultivam suas relações

Fora das redes, a conexão também é um traço importante da cultura dos 60+, e deve ser levada em conta pelas empresas. Marcados por valores que os levam a ter relações interpessoais mais profundas, esse público preza pela vida em comunidade.

Nos empreendimentos da A.Yoshii, essa necessidade é levada em consideração em vários pontos. Os empreendimentos com proposta Senior Living pensam na relação dos avós com os netos, por exemplo. Isso é materializado em playgrounds que pensem tanto nas crianças, quanto nos avós, com a presença de bancos confortáveis. Já nas demais áreas comuns, Beneli ressalta que é preciso pensar em propostas modernas, que levem em conta os verdadeiros desejos deste grupo. “Por que a gente não pode pensar, de repente, em um wine bar? Para tomar vinho e conversar com os amigos?”.

“Há 20 anos, o público com mais de 60 anos era visto como idoso. Hoje, é um público que tem potencial de compra e não gosta de ser visto assim. É um bom senso de posicionamento entregar qualidade, conforto, mas ser respeitoso e cuidadoso.” Maria Fernanda Beneli Vicente, gerente de marketing do Grupo A.Yoshii.

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Longe dos estereótipos, público 60+ busca novas experiências de consumo e está cada vez mais conectado à tecnologia